— Não sou um curador interessado em espetacularidade. Estou mais interessado em sentidos e relações. Acho que a Bienal tem a responsabilidade de mostrar uma via que não é do mercado ou da consagração industrial, mas do levantamento dos problemas a resolver, das questões iminentes, e tem também uma responsabilidade política — afirma ele, em entrevista ao GLOBO.
Obras articuladas
Pérez-Oramas soa mais coerente em sua defesa da Bienal distante do modelo de espetáculo (que parece reinar no mundo da arte) quando hesita em destacar nomes entre os 111 artistas selecionados para esta edição. Com o motivo “A iminência das poéticas” (ele prefere a palavra motivo à tema), a Bienal deste ano homenageará o brasileiro Arthur Bispo do Rosário (1911-1989).
As relações a que o curador se refere já começam nesse ponto: entre os 111 nomes, há artistas, como as americanas Elaine Reichek e Sheila Hicks, que trabalham com bordado, técnica tão usada por Bispo do Rosário. Há ainda ambientes, como o da instalação “Being different (somehow she’s so different)”, da alemã Anna Opperman (1940-1993), que remetem às cores e à intensidade do artista homenageado.
— Tais relações para nós são muito importantes. São parte de uma convicção simples: uma obra de arte sozinha não produz sentido. É a relação dela com um grupo que cria sentido — afirma. — Estamos tentando olhar para assuntos problemáticos e produtores de sentido. Olhamos processos que acontecem entre os séculos para perguntar: qual é a Bienal do século XXI? Que linhas se cristalizam potencialmente entre EUA, Europa e América Latina? Qual é a relação entre produção artística e digital?
Para a articulação com a era digital, a seleção contempla, por exemplo, o Mobile Radio, dupla da Inglaterra e da Alemanha (Sarah Washington e Knut Aufermann) que criará uma rádio na Bienal.
Diretor de arte latino-americana do MoMA, em Nova York, desde 2003 (e em licença do cargo para trabalhar na Bienal de São Paulo), Oramas já foi curador da coleção Cisneros, na Venezuela, uma das mais importantes da América Latina. Mudou-se para São Paulo em maio, a fim de cuidar da Bienal que, segundo ele, vem fazendo um “esforço grande para olhar até um lugar que não seja o mercado”:
— Não tenho nada contra o mercado, mas a Bienal não é um bazar, uma feira de arte. A Bienal não é um lugar para a monumentalização da memória ou a consagração definitiva.
45% dos artistas são latinos
Na seleção do curador venezuelano, 50% das obras são inéditas, produzidas para a mostra, e 45% dos artistas são da América Latina — reflexo da valorização da arte latino-americana e também de uma crença de Oramas: é preciso que se exponha aqui a arte que é produzida aqui.
— Nós, latino-americanos, esperamos que europeus e americanos legitimem o nosso trabalho. Mas isso tem que mudar. Pela primeira vez, os latinos estão conhecendo os latinos na América Latina. Estão viajando de Bogotá para São Paulo. Antes, para ver arte daqui, era preciso ir para Nova York ou Paris. Sendo o evento de arte mais importante das Américas, a Bienal precisa dar conta desse fato. Temos que superar esse complexo de inferioridade. Estamos perguntando sempre: o que estão pensando de nós? Temos que criar nossos próprios critérios e perspectivas e projetá-los — defende.
Para o curador, a valorização da arte latino-americana está menos ligada a fatores econômicos do que se pensa. É parte de “um longo e complexo processo” mais conectado à democratização dos países do que à sua força econômica ou à crise financeira na Europa.
— O Brasil está muito bem, mas eu não faria essa redução simplista. O processo de valorização da arte latino-americana começou faz tempo. A exposição do MoMA com os latinos, por exemplo, foi em 1992. Desde 1930, o MoMA tem um acervo de arte latino-americana. Ou seja, não é justo com o esforço intelectual reduzir tudo à questão econômica — completa Oramas.
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Alguns dos destaques da Bienal de São Paulo, que começa em setembro